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segunda-feira, junho 16

Um Conto Americano

Há alguns dias visitei finalmente ao Teatro Nacional D. Maria II, já desde há muito tempo que queria conhecer o teatro pensado por Almeida Garret. Já tinha andado pelo café e pela livraria do edifício, mas desde à muito que alimentava a curiosidade de me sentar numa poltrona e assistir a uma peça.

Foi precisamente na sala Garret que assisti à peça Um Conto Americano, adaptada a partir de um texto que originalmente era um conto para a rádio The Water Engine de David Mamet. A história é simples, muito simples até talvez e cheia de clichés. No entanto o tema que lhe serve de fundo não podia ser mais actual. Está ambientada em Chigago, nos anos 30, quando os americanos vivem mergulhados na Grande Depressão. Um jovem que trabalha como assalariado numa fábrica dedica-se ao ofício de inventor nas horas vagas, conseguindo desenvolver um motor que funciona apenas a água. Pensando que isso lhe trará fama e fortuna, e o livrará a ele e à família da miséria em que vivem dirige-se prontamente a um advogado de patentes. Mas a realidade não é tão cor-de-rosa, e a história acaba por ter um fim triste e sangrento com o protagonista a lutar por salvar a sua invenção.

Posso dizer que fiquei extremamente impressionado com a cenografia e todo o espectáculo em palco. Para isso contribuiu em muito a dimensão do palco e a qualidade da sala. Mas o que me chamou realmente a atenção foi o cenário, uma estrutura metálica única que se desdobra e roda sobre si de modo a seguir a história e os actores, trocando de ambiente num piscar de olhos. Isso e alguns efeitos cénicos para mim nunca vistos numa sala de Teatro como uma chuvada com água de verdade, nada de extraordinário, mas surpreendente na mesma. O texto apesar de não ter sido originalmente pensado para o formato teatral funciona muito bem. E os actores e figurantes também fazem um excelente trabalho a construir esta fantasia soturna e triste. A única peça do elenco que não me convenceu foi actriz principal, uma menina que já fez por aí umas telenovelas, mas que não sei se tem jeito para mais do que isso.

Em jeito de conclusão posso dizer que adorei a peça, a história é muito simples, mas além de ser extremamente actual olha com um olhar crítico a sociedade e como ela é controlada interesses económicos penalizando os comuns dos mortais muitas vezes. Creio que o nome escolhido para a adaptação portuguesa ao teatro deve qualquer coisa ao cliché do sonho americano, que aqui encontra a sua némesis.

terça-feira, janeiro 16

O Principezinho (de La Féria)

Mais uma montanha de tempo sem escrever... não é bloqueio de escritor, só preguiça, os pensamentos ultimamente absorvem-me. Vamos lá pôr a coisa em dia, normalmente quando vou ao cinema ou ao teatro faço um comentário, há umas coisas atrasadas.

No fim de semana passado volvi ao Teatro Politeama para assistir a mais uma adaptação de Filipe La Féria. O livro O Principezinho de Saint-Exupéry acho que perdura no imaginário de todos aqueles que tiveram a oportunidade de o ler. Se calhar classificado como livro para crianças, é muito mais do que isso. As personagens e situações parecem um sonho infantil e mirabolante, mas contam muito. Da jibóia ao homem de negócios todos metáforas, o fito talvez tenha sido explicar o mundo dos adultos na linguagem de uma criança, retratando-o com imagens de fantasia. Talvez seja o contrário, talvez seja o olhar de uma criança sobre o que a rodeia. Um olhar astuto e sagaz mas ao mesmo tempo cândido e inocente. Obra de um piloto de aviões, com a inclinação para escrever sobre as suas aventuras, ficou este livro adequado a todas as idades.

Existem várias adaptações, inclusive um filme, para mim nada conseguiu igualar a beleza do livro. Continuo a pensar o mesmo após ter ido ao Politeama ver a peça do La Féria. Até vou mais longe, aquilo foi um bocado fraquinho. O palco e um ecrã de fundo, actores e desenho animado, revezaram-se para ir contando a aventura do pequeno rapazinho de caracóis dourados. Os desenhos um pouco pobres, a cenografia também. Isto talvez passasse despercebido, se as personagens e as suas histórias estivessem bem delineadas, se conseguissem transmitir aquele olhar de que falava à pouco. Houve alguma originalidade na personificação de alguns intervenientes no livro mas estava à espera de mais, sobretudo depois da grata surpresa que levei da última vez. E desengane-se quem já viu esta peça apresentada como um musical, a música foi parca, as canções penosas! Alguém poderia ripostar que houve a necessidade de simplificar a coisa, para benefício dos mais novos. Não aceito esse argumento, simplesmente porque o livro é acessível a miúdos e graúdos, e é genial.

quinta-feira, dezembro 14

Música no Coração (ao estilo La Féria)

Em Portugal existe a ideia generalizada de que não existe acesso à cultura, ou que este é muito difícil. Somos todos uns pategos incultos, e que sempre o seremos porque somos pobres, no espiríto e no bolso. Isto para mim são balelas. A maioria das pessoas está-se nas tintas para a arte, isso é verdade, o que acontece é que os eventos que existem são dirigidos a esta ou aquela elite e não ao público em geral. Hoje estou aqui para escrever sobre teatro, e esta arte é um exemplo perfeito do que estou a falar. Existem inúmeros teatros em Lisboa, alguns no Porto, fora disso poucos, já estamos habituados às assimetrias regionais e isto parece natural, mas não é. Aqui caberia talvez aos municípios estimular a criatividade a nível local mas outros valores se impõem, é pena. Outro lado da questão, numa dada altura pode haver muitas peças em exibição, mas os grandes êxitos com "sucesso generalizado" (alguma ou outra peça que o zé povinho já ouviu falar) contam-se pelos dedos das mãos. As encenações de Filipe La Féria têm o dom de conseguir essa proeza, chegar não apenas ao clube restrito dos intelectuais e dos ricos que se gostam de ir pavonear para o teatro (estes são cada vez menos, hoje em dia há sítios mais in como o Casino) e conseguir que todo o Portugal oiça falar das suas peças. Desde já merece ser felicitado por isso.

Já não pisava um teatro à montes de tempo (desde o ano passado), que vergonha, um tipo com delírios pseudo-intelectualóides como eu e que não é frequentador habitual dos palcos devia era levar umas pancadas de Molière na tola como castigo. No outro dia tive a oportunidade de me redimir, uma amiga propôs-me a visita ao Teatro Politeama para vêr a adaptação aos palcos portugueses do clássico do cinema Música no Coração. Ela, fã incondicional do filme, e possuidora duma cópia que revê a intervalos regulares decidiu levar a filha ao teatro pela primeira vez, eu tive todo o gosto em acompanha-las. A pequena ficou impressionada, pode dizer-se até embasbacada com o teatro, o edifício, as luzes, os trajes, os actores, o desenrolar do pano e da acção. Como ela havia muitos espectadores de tenra idade na plateia. Espero que tenham ficado convertidos, precisamos ir buscar mais fãs dos Morangos com Açúcar e mostrar-lhes o que são actores a sério...

Mas vou falar da peça em si, já basta de divagar. O argumento é fiel à história original, a pequena noviça ingénua que gosta de bailar e cantar causa reboliço no convento e mandam-na tomar conta dos sete filhos do capitão Von Trapp, partir daí a história desenrola-se como todos sabemos. A nós calhou-nos assistir à interpretação de Lúcia Moniz, que se reveza com a Anabela no papel principal. Eu ia um pouco à espera de me aborrecer das cantorias a meio do musical, mas isso não aconteceu, todas as canções foram adaptadas ao português de forma excelente. Surpreendi-me com as capacidades interpretativas da actriz principal, de tal forma que não dei pelo tempo passar. A caracterização também é fiel ao original, com os trajes e os cenários a fazerem-nos lembrar a película. A propósito de cenários, convém dizer que todos os truques de cenografia ainda vêm trazer mais riqueza a todo o conjunto. Pequenas surpresas como quando o quarto da protagonista, que é no sótão, aparece vindo de cima e fica suspenso sobre o cenário da cena anterior. O desenrolar da acção leva ao sabido final feliz, mas creio que em toda a plateia ficou reavivado o sentimento de ingenuidade e fantasia que se experimenta ao ver o filme pela primeira vez. No fim foi o público que deliciou os intervenientes na peça com uma ovação em pé, bem merecida diga-se de passagem.

Como comentário final posso dizer que estou a pensar convidar as minhas duas acompanhantes para ir ao teatro de novo, também ao Politeama, ver a adaptação de outro clássico com o cunho La Féria que por lá passa nestes dias, o Principezinho.