quarta-feira, novembro 14

Le Voyage Dans La Lune

À uns dias escrevi sobre televisão, na realidade tinha-me proposto escrever sobre um canal fantástico de que sou fã, e em vez de escrever sobre o segundo escrevi sobre o primeiro. A RTP2 sempre foi para mim uma mixórdia deliciosa, com momentos um pouco mais aborrecidos e com demasiado eruditismo é certo, mas no final deixa bom sabor na boca. O Onda Curta é dos meus programas preferidos. Foi relegado para um horário extremamente inconveniente, como muitos programas que mereciam melhor. Quase a procurar um pretexto para dizer: não as pessoas não gostam de magazines culturais, ninguém os vê.

Foi lá que descobri a história desta peça arqueológica do cinema. Le Voyage dans la Lune foi obra de um dos primeiros artífices do cinema, Georges Méliès, que se baseou na obra de outro visionário, Júlio Verne. As imagens a preto e branco deste filme fazem parte do nosso imaginário colectivo. Mas a cópia a preto e branco não era mais do que a cópia que melhor tinha resistido ao passar do tempo, uma das muitas bobines que foram produzidas numa época em que as facilidades das cópias digitais estavam ainda a anos-luz. Uma particularidade do cinema de Méliès é que para dar mais apelo visual aos seus filmes, nas melhores cópias o celulóide era pintado à mão para que quando fosse visionado numa sala os espectadores fossem agraciados com um verdadeiro universo de fantasia.

Restaram algumas cópias intactas de outros filmes que atestavam a veracidade histórica das técnicas usadas... Mas da viagem à Lua não sobrou nenhuma... Até que uma cópia em grave estado de conservação foi encontrada. A história do restauro é um bocado rocambolesca, e fascinante para mim devo admitir. Um empenho quase fanático do historiador que encontrou a bobine para a restaurar, e mais tarde a ajuda de técnicas digitais permitiu que hoje em dia possamos ver o filme tal como ele foi exibido na época. Os sinais do tempo não foram completamente apagados, a restauração não é perfeita, mas tal só contribui para nos identificarmos ainda mais com as pessoas que tiveram a sorte de presenciar os primeiros passos da magia do cinema. Ah e a banda sonora de uma das minhas bandas preferidas só ajuda.

sexta-feira, outubro 26

Shut Up and Play the Hits

Aproveitando o DocLisboa finalmente pude ver este filme à noite no LuxFrágil. Como fã dos LCD Soundystem, e seguidor devoto que nunca teve oportunidade de os ver ao vivo, à imenso tempo que esperava a oportunidade. Infelizmente devido a factores que me escapam, políticas editoriais possivelmente, só ontem de se deu a ante-estreia em Portugal. A escolha do espaço creio que é uma novidade, mas devido à temática enquadra-se perfeitamente.

É óbvio que uma discoteca não é uma sala de cinema, nem é facilmente adaptável. ainda por cima a pequena multidão que foi atraída fez com que assistir ao filme não fosse uma experiência cómoda, antes pelo contrário, as pessoas apertavam-se e atropelavam-se para improvisar um assento. Ou arriscavam um torcicolo para encontrar uma linha de visão para um dos ecrãs que enchem o piso superior. A verdade é que assistir a um concerto nunca é cómodo, muito menos um concerto onde a sala está cheia, temos de transcender o desconforto físico e deixar-nos levar pela música e fundir-nos na multidão. Para mim no computo final esta escolha foi desconfortável mas brilhante.

O filme supostamente é sobre o fim da banda, o último concerto que marca o fim de um fenómeno meteórico e inesperado. Com efeito este é o cenário em que tudo se passa, mas o tema central é James Murphy. Uma pessoa normal que gosta de ser uma pessoa normal, fazer música porque gosta. Uma estrela da música tardia, que teve o seu grande sucesso já perto dos 40. Através de uma janela de alguns dias fomos projectados para uma vida normal, com as suas alegrias e tristezas, preocupações normais, frustrações e triunfos. Alguém que se considera estranho e que gosta de fazer coisas estranhas. Para quem quiser tentar ler a moral da história há uma mensagem de esperança e de  humildade, rodeia-te dos teus amigos, faz o que gostas, dá tudo.

Este documentário é algo mais que um documentário sobre uma banda ou um concerto, é uma reflexão sobre a arte, e o que nos percorrer novos caminhos, chegar mais além. E claro sobre a natureza humana.

quarta-feira, outubro 17

Livrem-se do generalismo e concentrem-se no serviço público

Ninguém sabe ainda muito bem em que moldes vai decorrer a privatização da RTP, qual será o canal que vão por no prego... ou serão os dois? Neste momento a opinião pública está mais preocupada com ideia de repor as finanças do país à custa dos contribuintes do costume, mas o assunto há-de voltar à baila em breve. Quero acreditar, e tenho esperança, que se vai manter alguma espécie de serviço público de televisão.

Neste momento existem quatro canais disponíveis em sinal aberto para Portugal Continental. Três deles são generalistas, o que equivale a dizer que a preocupação principal é capturar audiências. Mas a definição de generalista aqui não encaixa, na realidade não tentam agradar a toda a gente... A grelha está montada de uma forma exacta e premeditada  Tal e qual a organização das prateleiras num supermercado, as horas e os conteúdos estão organizados segundo uma ordem pré-estabelecida. O racional é agradar às pessoas que estão a ver TV (em sinal aberto) a uma determinada hora. Cativar os clientes potenciais para a emissão, mas também para a publicidade que sustenta esse mesma emissão. É Por isso é que os programas da manhã são para agradar a velhotes. E é por isso é que a telenovelas da noite têm tramas rocambolescas de invejas e mentiras aliadas a meninas com formas generosas que se despem à mínima oportunidade, assim aguenta-se marido e mulher, na sala a olhar para o mesmo ecrã. Na prática a TV generalista mais não é do que uma redução ao mínimo denominador comum.

Mas o modelo tradicional da distribuição de televisão está a mudar. A televisão por cabo, o pay-per-view, mais recentemente o vídeo na Internet, vieram mudar o panorama. Em Portugal esta mudança chegou recentemente, durante muito tempo estivemos habituados a ver o que nos punham à frente, mas qualquer lar no país pode ter um serviço de TV com os canais que prefere... Mais importante, os segmentos de mercado que são apetecíveis, as pessoas com um nível intelectual alto e com dinheirinho para gastar em produtos anunciados na TV preferem escolher o que vêm.

E claro o reverso da medalha, uma marca com uma imagem bem cuidada prefere anunciar os seus produtos através de um meio que seja compatível com essa imagem. Meter um anúncio de um carro alemão no meio de um reality show onde ninguém é capaz de responder a uma pergunta de cultura geral, não é de todo boa ideia. Possivelmente a mensagem chega a muita gente, mas não são as pessoas com a capacidade financeira certa. E existiria o perigo das pessoas do mercado alvo começarem a associar a tal marca de carros a macacos tatuados e loiras pintadas que guincham o dia todo. Catástrofe. Dir-se-ia que há uma técnica que não tem como falhar, associar uma marca a uma figura conhecida. A imagem de um futebolista e do seu carro para vender um champô anti-caspa por exemplo... Pode ser que funcione, mas acaba por ser ridículo  Em última análise cabe à própria marca decidir qual é o seu segmento alvo e como vai chegar até ele. Uma coisa é certa a fórmula fácil "vamos passar um anúncio na televisão e o nosso produto vai vender", morreu.

E é justamente este o paradoxo que aflige o mercado de TV actual  A luta é cada vez mais apertada, por um mercado de publicidade cada vez menos desejável. Este fenómeno só se vai tornar mais acentuado. E se as receitas de publicidade hoje não chegam para sustentar três canais generalistas, não vai ser no futuro que isso vai acontecer. A tendência para a TV "generalista" se cingir cada vez mais a segmentos de mercado pouco desejáveis em termos de publicidade só se vai acentuar. Um dia ainda vamos ver qual vai ser a apresentadora que vai mostrar o maior decote de forma a capturar as audiências a quem vender... colchões ou dietas milagrosas!

Por isso a minha opinião sobre toda esta história da privatização da Televisão é simples. Vendam o canal generalista o mais depressa possível, enquanto ainda é minimamente desejável. Mas por favor, há que reter a infraestrutura e as pessoas necessárias para manter um serviço público de televisão. Apoiar a produção nacional. Passar conteúdos didácticos e culturais. Prestar um serviço de informação sério e imparcial.

Em Directo (Para a Televisão) - Mão Morta

terça-feira, setembro 18

Meio Metro de Pedra

Preciso partilhar esta pérola de antropologia. É reconfortante ver que existem pessoas  interessadas pela divulgação da história da música em portugal. Mais detalhes na página do Meio Metro de Pedra.
Pela primeira vez em Portugal, está documentada a história da contracultura do rock'n'roll nacional desde o seu surgimento no fim da década de 50 até aos nossos dias. Na década de 60, inspirados por bandas como os Shadows, Bill Haley ou os Beatles, cerca de 3000 conjuntos de norte a sul de um país sob o alçada de Oliveira Salazar abalaram as editoras inconscientes deste som emergente. Um impulso de espírito ousado que percorreu o psicadelismo dos Jets, o punk dos Aqui D'el Rock, e se estabeleceu em pontos nevrálgicos como Braga, Coimbra ou Barreiro. Um pedaço da história de Portugal que tende a ser ocultado sobrevive através do selo independente da Ama Romanta, da Bee Keeper, da Lux ou da Groovie Records, e tem neste documentário de Eduardo Morais, a sua merecida celebração. Estreado em Outubro de 2011, este documentário percorreu, durante oito meses, cerca de 40 localidades por todo o país transportando a visão iconoclasta do realizador com uma lógica de exibições totalmente independente e autossustentada, à semelhança do próprio método de produção deste filme. Com uma pequena ajuda da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, Eduardo Morais esteve dois anos em pré-produção e rodagem por mera carolice e desejo de poder levar o seu trabalho a um público sempre interessado e atento.

quarta-feira, agosto 1

Fazer localização geográfica com o telemóvel

Da última vez que escrevi falei de localização geográfica, como se relacionava com a fotografia, e para que servia. Tal como prometido hoje vou falar de um método simples para armazenar a informação geográfica num telemóvel e mais tarde relacioná-la com as nossas fotografias. Os exemplos que vou citar referem-se equipamento de que disponho pessoalmente, mas o importante é o método. Facilmente podemos encontrar as ferramentas necessárias para lidar com outro tipo de equipamento.

A lista de pré-requisitos é simples, uma câmara fotográfica digital, e um smartphone. Um pormenor a ter atenção é verificar que os relógios de ambos estão sincronizados. É a partir da dimensão temporal que vamos estabelecer um paralelo entre a informação de localização que vamos armazenar no telemóvel, e as fotografias que capturarmos. O processo tem portanto duas fases distintas, numa primeira fase, e ao mesmo tempo que estamos a fotografar, recolhemos os dados no smartphone. Mais tarde, incorpora-se essa informação nas próprias fotografias, num processo conhecido por "Log Matching".

O primeiro passo é instalar no nosso smartphone uma aplicação capaz de gravar o nosso percurso. Hoje em dia existem inúmeras aplicações vocacionadas para o desporto que nos permitem saber a distância percorrida e velocidade. Na realidade essas aplicações registam o nosso trajecto através de dados de posicionamento GPS e realizam cálculos sobre esses dados. Apesar de não estarem vocacionadas para fotografia são exactamente o que precisamos. Pessoalmente tenho um telefone Android e uso o My Tracks da Google. Para iOS poderá ser utilizado algo como o Runkeeper. O que app tem fazer é registar o nosso percurso e permitir mais tarde realizar a exportação para ficheiro, em formato gpx de preferência.

Quando decidirmos ir fotografar convém verificar a questão dos relógios que falei acima. Depois é só ligar a aplicação, e dar asas à imaginação. Como falei a maioria das aplicações estão orientadas ao desporto, portanto é como se começámos uma corrida cada vez que começamos a disparar. Uma vez terminada a sessão de fotografia assinalamos o fim do trajecto e já está. A aplicação vai guardar o nosso percurso. Convém guardar a data e alguma informação descritiva para poder mais tarde identificar objectivamente os vários trajectos que se podem ir acumulando.


Numa fase posterior, quando tivermos um computador pessoal disponível devemos exportar os dados do nosso trajecto no telemóvel e usar um programa de edição gráfica para incorporar a informação nas fotos. A maioria dos programas de pós-produção fotográfica mais conhecidos implementam a funcionalidade necessária (Aperture, Lightroom). Pessoalmente uso o Nikon ViewNx2, gratuito e com imensas potencialidades. E lá por ser da Nikon não quer dizer que não funcione com outras câmaras, pelo contrário. Depois de carregar as fotos no nosso programa preferido, devemos seleccionar-las e escolher a opção log matching. Nesse momento vamos carregar o ficheiro .gpx que fomos buscar ao telemóvel e será estabelecida uma relação automática entre as fotos e os locais. Não esquecer gravar as alterações...



Se a ideia de tudo isto for mesmo fazer upload das fotos para algum sítio, como foi o meu caso, é melhor assegurar-nos que o sítio web que estamos a usar vai ler esta informação. Por exemplo eu tive de ligar o suporte para as tags GPS no Flickr. Também existe a possibilidade de realizar este processo de "log matching" online com fotos que já foram penduradas online anteriormente.

terça-feira, julho 10

Localização geográfica de fotografia

O artigo de hoje vai ser introdutório, neste texto vou explicar alguns conceitos, mais tarde vou partilhar um método simples e pouco dispendioso para fazer a etiquetagem geográfica de fotografias. Este termo foi a melhor tradução que conseguir encontrar para geotagging, mas acaba por descrever exactamente o que pretendemos atingir, embeber numa fotografia a localização geográfica exacta onde foi captada. Também existem métodos para registar este tipo de informação noutros meios (vídeo e páginas  html por exemplo) mas vou falar do caso concreto da fotografia apenas.

A localização geográfica é utilizada por profissionais de algumas áreas para conseguir uma representação muito fiel de um local, por exemplo um levantamento arqueológico ou geológico. Mas pode servir simplesmente para organizarmos as fotos das férias. É claro que se for necessário um elevado grau de confiança uma solução técnica profissional poderá ser mais indicada.

Hoje em dia muitos serviços que usamos diariamente como o Google ou o Facebook dão cada vez mais importância à informação geográfica, e esforçam-se por saber por onde andamos. É óbvio que se levantam algumas questões sobre privacidade, num mundo cada vez mais público, precisamos ter algum cuidado com o que revelamos. O sítio web que uso para armazenar e organizar as minhas fotos também suporta informação geográfica, é a minha galeria que vou usar como exemplo mais à frente. Sobrepondo num mapa fotografias podemos reviver percursos feitos em tempos, talvez perceber como (re)visitar algum local que nos tenha deixado encantados. O Google Maps há muito que implementa esta funcionalidade.


Os formatos que usamos normalmente para manejar as imagens captadas pelas nossas câmaras estão preparados para conter mais informação além da imagem propriamente dita. A etiqueta EXIF é uma forma normalizada de guardar informação auxiliar. Por exemplo a informação óptica sobre a captação da foto é armazenada lá. A abertura, o tempo de exposição, e a sensibilidade ISO são os dados básicos. É também aqui que vai ficar registada a informação geográfica. Podemos visualizar essa informação através das propriedades do ficheiro no sistema operativo, no entanto um programa de fotografia dará muito mais informação. Podem espreitar as propriedades de uma foto que tirei nas minhas últimas férias para ter uma ideia, entre muitas outras coisas estão lá as coordenadas GPS.

Hoje em dia qualquer smartphone tem esta capacidade, basta a opção estar activa o telefone ter o serviço GPS disponível e irá a imagem ficará automaticamente geolocalizada. Já existem algumas câmaras fotográficas no mercado com esta função, mas normalmente as soluções para DSRL's são dispendiosas, implicando a compra de um acessório separado. Fiquem sintonizados para saber como fazer isto virtualmente grátis...


quarta-feira, maio 16

Os projectos falhados servem para aprender

No final do ano passado, mais concretamente na noite de 25 de Dezembro tomei uma decisão. Foi uma espécie de resolução de Ano Novo, ou antes resolução de Natal dada a data. Sentindo-me cada vez menos activo na minha labor fotográfica e criativa no geral quis encontrar uma forma de obrigar-me a mim mesmo a produzir qualquer coisa.

Foi assim que decidi embarcar num projecto 365. É um ideia bem estabelecida que muita gente já tentou e através da qual produziu resultados às vezes interessantes, mas sobretudo palpáveis, algo que tem de acontecer todos os dias. E para o qual chegado o fim da odisseia podemos olhar para trás e saborear.

Dois requisitos essenciais para que um empreendimento destes funcione são em primeiro lugar andar com uma câmara sempre atrás, e em segundo lugar que seja muito fácil expor o resultado diário. Ora isto é muito fácil com qualquer telemóvel moderno e a montanha de aplicações para telemóvel que apareceram num ápice. Tratou-se pois de escolher uma aplicação e começar... Na altura a mais popular, o Instagram, ainda só estava disponível para dispositivos Apple. Assim decidi-me pelo Lightbox... Hoje em dia o Instagram já está disponível para Android, além disso as empresas que fazem as duas aplicações foram compradas pelo Facebook... Presumivelmente com o objectivo de se tornar os Reis da partilha de fotografias... mas estou a divagar.

Quando comecei eu próprio ainda não sabia muito bem como é que ia lidar com o desafio. O meu objectivo não era claro, apenas obrigar-me a tirar fotografias. Lembro-me que um dia, talvez um mês depois de começar tive uma epifania. As imagens estavam-se a tornar de uma espécie de diário, não dos acontecimentos do dia, mas do sentimento particular que me marcou. À medida que a coisa avançava outra conclusão mais ou menos óbvia foi que a larga maioria dos meus dias eram rotineiros, condicionados por um ritmo bem marcado.

Saíram coisas mais ou menos interessantes, outras nem por isso. Em termos estritamente fotográficos há coisas que poderiam servir de base ao desenvolvimento de algo, nada mais. Não fiquei particularmente contente com a qualidade ou originalidade... Claro que tudo acabou de uma forma super simples, um dia esqueci-me, e pronto deixei a coisa acabar. Pensei no assunto, podia fazer batota, mas há que respeitar o ciclo natural das coisas. E se acabou, acabou. Ficaram as fotos e os locais no meu perfil do Lightbox, e também num set do Flickr que deixo a seguir para entrarem na minha vidinha aborrecida.