Realmente acho que não tenho medo do escuro, pelo menos na definição literal, não tenho problemas em estar às escuras. Ainda adolescente quando apanhava uma bezana das grandes e entrava a casa de madrugada enfiava-me sorrateiramente em casa, não acendia a luz como é óbvio, e tentava-me arrastar até ao quarto sem alertar ninguém. Claro que muitas vezes a iniciativa era gorada pelo minha descoordenação psico-motora natural, agravada pelos eflúvios do álcool. Tropeçava nisto ou naquilo e depois a bronca ainda era maior, mas voltando ao tema que me traz aqui hoje, nunca temi tactear o meu caminho.
O estar deitado às escuras é outra história, não me é confortável. Sempre tive, e continuo a ter o hábito de cobrir-me completamente, aninhar-me nos lençóis, e esconder-me como uma lagarta se esconde no seu casulo. Logo logo me desvaneço nos braços da noite. Quando assim não acontece é mau sinal, fico deitado a contemplar o tecto às escuras. O negro da noite não tarda em transformar-se, pensamentos, congeminações e planos reflectem-se nas minhas pálpebras. E nesses dias não há quem pregue olho. Não me assusto com as sombras, mas com as imagens que me assaltam. Obstáculos invisíveis revelam-se, tarefas titânicas esmagam-me. São noites sem descanso. Sem luz que me guie no escuro, tenho de confiar na intuição, que me leve até porto seguro.
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